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Enem e escolas que permitem tudo
Divulgação
Publicado em: 13/12/2013 - 13:12
Algo sinaliza que há escolas particulares e públicas com dono. Diferentemente do que dizem das particulares, “estou pagando” ou “pagou passou”, há aquelas caras e rigorosas. É o caso do Bernoulli. E aqui, não vou poupar modéstia: meu filho, físico e matemático para quem tiro o chapéu, acabou de fazer o 3º ano do Ensino Médio nessa escola que ficou no segundo lugar nacional no Enem. Nela existe exigência e rigor. Eu a visitei e vi que os alunos gostam disso. Precisamos aprender que democracia tem limites.
Bem recentemente, já cansado, meu filho perdeu a hora. O máximo que conseguiu foi permanecer na sala de estudos da escola. E fez questão de ficar lá. No apartamento, não teria sentido. Queria estar em sala de aula. Foi o que me disse quando o acionei, tão logo eu soube do ocorrido. E, quando ligarmos para o colégio, a resposta do coordenador foi clara: “O aluno teve conhecimento do regimento interno no primeiro dia de aula. Ele conheceu as regras. O máximo que posso permitir é deixá-lo na sala de estudos, como me pediu. Nem isso eu deveria fazer.” Como educador, concordei com a decisão e tirei o chapéu para eles.
As escolas boazinhas estão mal no Enem. E há várias na nossa região e Brasil afora. Talvez essa mazela esteja presente mais nas particulares, mas as públicas não fogem à regra. Nelas, os alunos entram e saem, de forma abusiva. Depois que apareceu o paternalismo dos conselhos tutelares, os alunos começaram a ditar as regras, em muitas escolas. E, com medo, os dirigentes recuaram. Essa é uma das causas do fracasso no Enem, pois as escolas se tornaram um corpo sem cabeça, uma Organização sem organização. Nelas ocorre tudo, menos aprendizagem e autoridade. Em todo lugar, os subordinados têm a cara do dono ou dirigentes da empresa. E as escolas, que permitem tudo, estão colhendo o fruto de suas (in)decisões.
O resultado do Enem 2012 revela que as escolas públicas estaduais fracassaram, salvo raras exceções. Estão mesmo uma miséria sem nome. Muito se deve às famigeradas políticas públicas, de aprovação automática e programas assistencialistas de marqueteiros do governo mineiro, como o ‘acelerando o passo’ que atalhou a qualidade mais excluindo do que incluindo. E isso continua acontecendo.
E por qual razão as escolas públicas federais se destacaram no resultado do Enem 2012, enquanto as estaduais fracassaram? Aposto em duas hipóteses que podem ser contestadas, à vontade, pelos leitores, a quem darei o direito de resposta e espaço nessa coluna. Uma é o fato de que as escolas públicas estaduais estão permissivas, onde para muitos diretores o cargo virou trampolim político. Nisso se une ‘a fome com a vontade de comer’. Interessa ao governo estadual mostrar cifras de resultado mentirosos e isso agrada os alunos. E aos diretores agrada fazer média com alunos, dá voto, popularidade e poder. Só que isso é tiro no pé: ao permitir tudo, as estaduais fracassam. Volto a insistir: as políticas de aprovação automática incidem em desprezo e desrespeito aos alunos que, por sua vez, quanto menos cobrados, mais batem palmas e aprovam o sistema descabido. Aliás, não faltam os pais, responsáveis e os alunos que adoram a solução meia boca, principalmente ao se tratar de atividades intelectuais. E é só ir a casa deles para se constatar que possuem vários eletrônicos, mas nem um livro sequer. Por isso, não estudam.
Isso não é o que ocorre com alunos das escolas públicas federais, como na Universidade Federal de Viçosa (UFV) e Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em suas escolas de aplicação, onde adotam o Vestibulinho. Entram os que querem e gostam de estudar. E quem dá aulas para os meninos são mestres e doutores que cobram e são valorizados por isso. Há muito não acredito mais na tese da universalização da escola. Não faz sentido haver universalização de algo que não é desejado por todos. O médico que não é vocacionado à medicina mata os pacientes e fracassam o hospital. Alunos e professores não vocacionados fazem o mesmo com a escola. E a aprendizagem e os resultados caem.
Tanto é que no Centro Pedagógico, também ligado à UFMG, os professores passaram a ter sérios desafios depois que o Vestibulinho aplicado no ensino fundamental foi substituído pelo sorteio. Ainda que o desempenho do CP tenha se mantido bom pelos índices do Ideb a realidade dos docentes já não é a mesma, uma vez que os docentes depararam com uma clientela heterogênea, onde muitos não gostam de estudar.
Enfim, estamos diante de dois tipos de escolas. Daquele onde se estuda e daquele onde se tem apenas aulas. Nos primeiros, há aprendizagem e resultados positivos, no segundo, inventam-se resultados. As públicas estaduais lideram esse grupo. Isso, sim, gera tese que me parece mais consistente do que a universalização automática da educação para todos, qual seja: temos dois tipos escolas: as que conquistam resultados e as que os inventam, irresponsavelmente. Por isso, nossa democracia continua formal, apenas uma caricatura.